segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Agnaldo Timóteo

Peguei a pauta do dia na editoria política do Estadão, onde trabalhava nos idos dos anos 80 do século passado. A missão: entrevistar o cantor Agnaldo Timóteo, que pedia votos para o candidato à presidência da República, Paulo Maluf. Marcou um café da manhã em hotel no centro de São Paulo, onde estava hospedado. Apresentou a um dos seus inúmeros irmãos, que nos levaria no carro conversível. Na campanha anterior, para o governo do Rio de Janeiro, ele tinha apoiado o então candidato eleito Leonel Brizola.
Era o tempo das fitas cassetes. Timóteo colocava as fitas em um aparelho e fingia cantar. Às vezes dava os primeiros acordes e a música ficava rodando. Fomos para a zona leste da cidade. Muitas fãs o cercavam. Ouvi de uma delas: "É feio, mas canta bem este danado". O cartunista Ziraldo tem a mesma idade de Timóteo e o conhece de Caratinga, Minas Gerais. Disse que ele sempre quis cantar. Tinha a pretensão de cantar músicas clássicas como um barítono. Saiu de sua cidade pequenina no interior mineiro para ganhar o mundo, o começo no Rio de Janeiro, onde foi motorista da cantora Ângela Maria. Perguntei para ele se isso era verdade, ele mostrou-se aborrecido: "Claro que é verdade".
Enquanto fingia que cantava para suas fãs na zona leste vi descer do ônibus o meu amigo Maurício Pestana, cartunista ligado aos negros, mais tarde secretário municipal da desigualdade racial. Ao me ver ele veio conversar, saber o que estava acontecendo.
A reportagem não saiu, foi engavetada pelo subeditor de Política. Um colega que trabalhava na concorrente Folha de S. Paulo, um certo Fernando Gabeira, fez a matéria e Agnaldo Timóteo o elogiou pelo microfone, o mesmo canal por onde cantava para alegria de suas inúmeras fãs.