sábado, 29 de março de 2014

Jair Borin


A vocação de revolucionário despertou nos embates da juventude, onde militou na União Nacional dos Estudantes, a UNE. Concursado na maior universidade brasileira, a USP, assumiu o cargo e, pela competência, ficou responsável pela impressão de tudo o que era trabalho na gráfica daquela instituição. O então reitor levou um jornal do Exército para ser impresso de favor na Universidade, ao que Mestre Jair Borin recusou com um sonoro “não”. Sorrateiramente o reitor, que certamente tinha amigos influentes nas Forças Armadas, levantou a ficha do professor e constatou que ele tinha débito com a justiça militar. Era um “subversivo”. Um dia, quando estava em sala de aula o professor foi retirado por dois soldados do Exército que serviam na mesma unidade onde ele se recusou a imprimir o jornal e foi levado para o Presídio Tiradentes, onde cumpriu pena de 2 anos. Lá dentro havia presos comuns, então ele deu aula para os analfabetos, a grande maioria. Depois disso, não teve mais emprego em jornal.

Estávamos no ano de 1975 quando o conheci na Folha de S. Paulo, onde trabalhamos juntos. Ele estava ali porque teve o aval de um colega nosso muito bem relacionado com o dono do jornal, um certo Eduardo Suplicy que andava de moto, que pediu para Octavio Frias de Oliveira que empregasse o ex-preso político, repórter de Economia dos bons.

Uma vez o encontrei em um bar da Praça da República, ele estava com a esposa. Ao tomarmos cafezinho ele lembrou que tinha exatos dez anos a mais que eu. Também me levou, em seu carro, à redação do jornal alternativo “Movimento”, onde me esperava o diretor Raimundo Pereira, e a partir daí passei a colaborar com mais frequência no semanário e sempre recebi pelos trabalhos, é bom ressaltar, nunca me foi pedido trabalho voluntário e sem remuneração apesar de toda dificuldade financeira em se manter um jornal de oposição.

Cruzei com Jair Borin no Vale do Ribeira em reportagem sobre conflito armado de terras. Mais tarde, já nos anos 80 do século passado, ele me convidou para trabalhar na assessoria de comunicação da Ceagesp, subordinada à secretaria estadual da Agricultura, onde ele comandava o departamento de imprensa, agora em mãos de Franco Montoro, depois de uma ditadura de 21 anos.

Anos mais tarde, de volta à Universidade, candidatou-se a reitor da USP, perdeu embora tivesse trabalhado bem, tinha o voto do pessoal mais humilde daquela instituição, só não ganhou da elite que comanda aquela universidade há mais tempo e conhece bem os truques eleitorais.

Jair Borin merecia da USP ter seu nome em um dos prédios, é mais do que merecido por seu valor, competência e coragem.

domingo, 23 de março de 2014

Leonel Brizola

Uma reportagem com o governador Leonel Brizola rendia assunto, mas nunca o lead (início, abertura da matéria), eram horas e mais horas interessantes que pareciam segundos. No auditório muita gente. Bem na frente nós, repórteres de jornais, rádio e TV anotando, registrando tudo. No final aquilo de sempre: trocávamos figurinhas, se houvesse algum dado que estivesse faltando era só acrescentar.
Nos jornais ele era aceito, tinha muito peso, mas não era dos mais queridos personagens. Sabendo disso teríamos de ser o mais sucinto possível. Mesmo porque sua fala se arrastava por horas a fio, mesmo se ele estivesse entre um compromisso e outro, paletó nas costas, mangas arregaçadas, a  mesma firmeza de sempre.
Tudo certo, no dia seguinte saiu a nota. Meu chefe, no entanto, trouxe um dos jornais concorrentes com a foto de uma moça de peito de fora, Brizola ao fundo falando, falando. Não havia visto a moça, uma das strippers que um dia alguém disse que ela poderia se candidatar a cargo eletivo em São Paulo, como houve na Itália com uma certa Cicciolina. Levei uma bronca enorme. Liguei para os colegas que estiveram na mesma palestra, ninguém havia visto a exibicionista, a tal matéria era uma jogada de marqueteiro de fundo de quintal que privilegiou o diário carioca com um "furo".
A explicação não colou muito, mas no dia a dia da reportagem é assim, um dia a gente faz uma boa reportagem, no dia seguinte ela poderá ser apenas razoável, depende de uma série de fatores.
Quando Jânio Quadros estava no caixão contei para Brizola que o Presidente não gostava de uma brincadeira que seu neto fazia anunciando uma suposta visita de Leonel de Moura Brizola, Jânio dizia que era "brincadeira de mau gosto", ao que o gaúcho deu três tapinhas no rosto de JQ e, rindo, disse apenas o que entendi como uma homenagem: "Gracinha!".

                                                         Brizola, um dos maiores políticos do Brasil

domingo, 16 de março de 2014

Cavalos

Cavalo também é gente. Cerca de 240 cavalos se encontram de quarentena no quartel da Polícia Militar na região da Luz, centro de São Paulo, com o risco de serem sacrificados com injeções letais. Há 7 anos surgiram relatos de casos ocorridos no interior do estado e em Pernambuco de uma epidemia. Em uma análise preliminar, 36 desses animais estavam sob suspeita de terem contraído o mormo, uma doença que ataca o sistema respiratório e compromete pulmões, com risco de até passar para seres humanos.
Cavalos que andam montados por policiais militares fizeram estragos anos atrás. Foram utilizados para invadir a Pontifícia Universidade Católica, a PUC paulista, sob ordens do então secretário da Segurança Pública, coronel de Exército Erasmo Dias. Em uma entrevista na placidez de seu gabinete, perguntei a ele a respeito de queixa de moradores de que os bichinhos sujavam a cidade, ao que ele espumou de raiva e se saiu com essa: "O que o senhor prefere, que os bichos sujem as calçadas ou que os bandidos lhe metam uma arma na cara?".
Sugeri a alguns parlamentares apresentar projeto retirando dos cavalos essas funções de patrulhamento da cidade. Ninguém se sensibilizou.
Um dia trabalhei em gabinete com um coronel da Polícia Militar que explicou a função desse tipo de patrulhamento: dar ao cidadão a sensação de segurança. Ao ver da janela de um apartamento aqueles grupos de cavalos trotando nas ruas da cidade, o contribuinte tem a sensação de que está seguro, que nada de mal acontecerá à sua vida.
Ah, bom!

domingo, 2 de março de 2014

Bernardo Cabral



Acompanhei a Constituinte como repórter da Veja e depois do Estadão. Uma das lições que um repórter de Política aprende é cultivar suas fontes. Foi o que fiz com o relator dos trabalhos, o deputado federal Bernardo Cabral. Ele me convidava para almoçarmos no restaurante da Câmara, onde nos reuníamos com o querido amigo, o saudoso Flamarion Mossri, cunhado do José Dirceu, da sucursal de Brasília, experiente na arte de entrevistar políticos da velha guarda. Flamarion e Cabral se conheciam desde os anos 1960, vejam só, e conservavam no mesmo grupo velhas amizades,  deputados paulistas Mario Covas, Franco Montoro e Ulysses Guimarães.
Vez ou outra dava uma passada no gabinete de Bernardo Cabral para saber das novidades. Uma das vezes ouvi ele dizer para a mulher que estava "com aquele repórter de São Paulo, lembra?, o Rivaldo, e vamos sair para jantar". Não jantamos nem havíamos combinado nada. Mas, tudo bem.
Certo dia, Bernardo Cabral foi ao programa "Roda Viva" e o diretor do Estadão, Oliveiros S. Ferreira, fez uma pergunta que deixaria o entrevistado constrangido: queria saber por que o então presidente José Sarney havia conquistado 5 anos de mandato sem que o Congresso soubesse. Resposta no ar: "Não é verdade que não sabíamos, é só ler o Estadão que o Senhor dirige e ver que saiu matéria do Rivaldo onde eu afirmei que Sarney governaria por 5 anos".
No dia seguinte ao cruzarmos nos corredores do Estadão, Oliveiros me deu um abraço, o primeiro que ganhei de uma alta patente no jornalismo. Grande Oli!
Hoje Bernardo Cabral assessora a Federação do Comércio do Rio de Janeiro.