quinta-feira, 13 de maio de 2021

Tonico e Tinoco

 Naquele tempo, anos 70 do século passado, não tinham inventado o tal sertanejo universitário (ainda bem) e quem reinava em todas as rádios era uma dupla genuinamente caipira e que estava em alta com programa feito ao vivo na rádio Bandeirantes, no Morumbi, que permaneceu por décadas como os campeões de audiência. Marquei uma entrevista com a primeira voz da dupla, Tonico, que me convidou para que tomasse o café com ele em seu apartamento onde morava com a esposa na rua da Moóca, conhecida via pública da zona leste paulistana. Pensei encontrar também seu irmão Tinoco, mas este aparecia vez ou outra, trocava algumas palavras com a cunhada e se despedia. Perguntei se eles ensaiavam, Tonico disse que não, era pegar a viola e mandar ver. Quis saber se eles tinham alguma dupla que seria seguidora deles, o violeiro respondeu sem vacilar: Chitãozinho e Chororó. "Esses meninos vão longe", disse a respeito da dupla que um deles traria ao mundo mais tarde: a dupla de irmãos Sandy e Júnior. 

Tonico me recebia com café, bolo de milho, suco de laranja e várias histórias. Uma vez apareceu uma foto na revista O Cruzeiro onde a dupla descia de um avião. Quem fez a legenda atribuiu o bimotor à dupla, que nunca desmentiu: "Para nossa imagem ficou o máximo, mas nunca fomos donos de avião, longe disso".  Vi um desses boletos com a renda de um circo e fiquei chocado com valor irrisório ali constatado porque a dupla participava dos resultados das bilheterias.

Nossas sessões duravam vários dias. Em um desses dias levei como convidado o cartunista Jota, José Luiz Pires, chamado de "repórter especula", que publicou matéria de página inteira na Folha de Londrina. Redigi duas entrevistas, que foram publicadas no jornal Movimento, última página, com o título "Da enxada ao rádio". E na última edição do jornal Opinião, com o título "A grande festa dos violeiros".

Lembrei desse episódio ao ouvir de longe os acordes de uma dessas duplas sertanejas universitárias que falavam de traição, ofensa, desprezo e tudo o que há de mais horroroso no ser humano. Tonico e Tinoco e todos aqueles que os seguiram não chegaram a tanto. Acho que eles acreditavam em dias melhores.