segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

Aloysio Biondi

Trabalhei com ele na sede da Margem Editora, ele como editor do newsletter Relatório Reservado, dirigido aos empresários, e eu responsável pelo jornal alternativo Repórter, editado no Rio de Janeiro pela mesma empresa. Isso nos anos 80 do século passado, bem no centro de São Paulo. Aloysio eu conheci na Gazeta Mercantil, onde passava de vez em quando a convite da colega Carly Baptista, de Brasília, que fazia questão de que nos tornássemos amigos. Por uma dessas coincidências, Aloysio Biondi foi trabalhar na mesma sala imensa que ele infalivelmente fechava a chave altas horas da noite. Eu ficava pouco tempo, a equipe de colaboradores do jornal era pequena e as pautas necessitavam de muito tempo, era se executasse uma missão impossível.
Conheci na época uma certa Márcia Biondi, prima do Aloysio, que trabalhava no escritório do advogado Aldo Lins e Silva, de presos políticos. Mas a conversa com o grande jornalista versava quase sempre sobre nossa família - ele e seus filhos e eu e meus filhos. Nada de grandes assuntos nacionais, isso ele deixava para engordar a pasta que carregava embaixo de um dos braços.
Sei que Aloysio Biondi deixou uma legião de seguidores, gente da mais alta qualidade, na área de Economia. Escreveu um belo e importante livro sobre as privatizações. Era uma daquelas pessoas que achavam que todos deveriam entender dessa importante área, a Economia que ele manjava como poucos.
Não lembro de ver o Aloysio Biondi aborrecido ou frustrado com alguma coisa, ele que pensava no macro, nunca no varejo. Levava a vida como ela deveria ser levada. Dados mais importantes e precisos sobre ele vão ficar para os especialistas. Dele lembro que nos encontramos na porta da Folha de S. Paulo, ambos  subindo à direção, eu com um cliente e ele sozinho com a pasta cheia de recortes, certamente para discutir no mais alto nível os rumos deste País infeliz.



quarta-feira, 10 de julho de 2019

O Velho Passos

O Velho Passos, como o chamávamos na redação do jornal Cidade de Santos nos idos dos anos 70 do século 20, não era propriamente por causa da idade e, sim, pela sua voz sempre calma em todos os momentos e conciliador, sempre com alguma novidade debaixo do braço. Um livro, um panfleto, uma fotografia. Estava um ano à frente na faculdade, para onde íamos juntos à noite. Passávamos no boteco e pedíamos sanduíche de mortadela, que ele mantinha em segredo até que uma colega nossa da chamada elite santista tentou experimentar, não teve coragem e polidamente agradeceu.
Uma manhã bem cedo cheguei na casa do Velho Passos com dezenas de jornais amarrados em uma corda. Era o primeiro número do jornal Versus, que tínhamos feito na casa do idealizador, Marcos Faermann. Já que eu ia para lá, por que não aproveitar e levar para o colega José Meirelles Passos e deixar com ele antes mesmo de o jornal ir para as bancas? Sua mulher falou: "Acorda Zezé porque seu amigo está aí chamando, deve estar fugindo da polícia".
O Velho Passos deu algumas voltas pelo mundo, a começar pela América Latina. Entrevistou dezenas de ditadores e também o legendário escritor Jorge Luiz Borges, cedo àquela altura.
Viveu anos em Washington, onde trabalhou como correspondente de O Globo. Mesmo acometido de uma doença que havia contraído na juventude, 50 anos antes, fase passada em Lorena, interior do Estado de São Paulo, próximo ao Rio de Janeiro, quando ainda era químico, ora veja, ele trabalhou em meio a tantos papéis que tentava decifrar, segredos da Casa Branca.
Com recado do amigo Adelto Gonçalves fui vê-lo no hospital Sírio-Libanês onde ele se encontrou com um dos ditadores de plantão nesta Nuestra América e lembrou que tinha fotos nossa na greve dos metalúrgicos que despontou para o mundo um operário de nome Luis Inácio Lula da Silva, que seria presidente da República por dois mandatos. Nessas fotos aparece um sociólogo que encontramos no ABC e que também sucederia Lula na presidência da República, Fernando Henrique Cardoso. Contou que havia separado as fotografias e que me enviaria dias depois. Não foi possível. Um dia, quem sabe, veremos essas fotografias em alguma galeria por este mundo afora.