domingo, 23 de novembro de 2014

Eder Jofre

O primeiro campeão mundial brasileiro de boxe foi invicto por alguns anos. Tem seu nome no Hall da Fama do Boxe em Nova York. Nos anos 1960 se estabeleceu em uma cobertura nos Jardins, em São Paulo, onde hoje vive. Parou de lutar em 66 ao perder para o japonês Fighting Harada, com quem se encontrou anos mais tarde e se abraçaram. Conhecido como o "Galinho de Ouro", voltou a lutar em 69, agora como peso-pena. E sagrou-se campeão mundial de novo. Em 77, no auge, encerrou a carreira definitivamente. Tentou entrar no ramo de confecção com o selo "Galo de Ouro", costurando roupa de cama, mesa e banho. Em 1986 foi eleito vereador por São Paulo e reeleito durante 16 anos. Nesse tempo eu o conheci na Câmara Municipal.
Trabalhava por lá com um vereador e que tinha a sala em frente à sua. Uma noite ele tentou entrar, mas a sua sala principal estava fechada a chaves. Procurou na pasta, revirou tudo, não encontrou. Dei a sugestão por brincadeira: "Dê uma porrada bem forte, como nos velhos tempos". Topando a brincadeira ele posou como se estivesse no ringue. Simulou estar socando a porta de seu gabinete de vereador. Demos risadas. Até que sua secretária ligou para o setor de manutenção do prédio e alguém trouxe uma cópia da chave e abriu a porta.
Falava no dia seguinte com o editor da coluna "Painel" da Folha de S. Paulo Andrew Greenles, hoje vice-presidente da CDN, a maior agência de comunicação empresarial do País, e ele publicou a nota.
No dia seguinte entrei no gabinete de Eder Jofre, que estava com o jornal em sua mesa, todo sorriso. Liguei para o Andrew, mas antes disse que o colega era escocês. Eder se dirigiu a ele em inglês impecável. Falaram por meia hora. Nada de português. Nessa hora ele era só alegria.

domingo, 9 de novembro de 2014

Bolivianos

Tenho cruzado com certa frequência com bolivianos, a todo dia e a quase toda hora. Moro no centro da cidade de São Paulo, e é onde uma parte deles se concentram. Se bem que tem um bairro onde eles se reúnem nos finais de semana para se encontrar, trocar ideias, falar mal da vida, conversar sobre empregos. Tem uma rádio comunitária, onde cada um manda mensagem para amigos ou parentes que estejam por aqui ou que permaneceram em seu país, bem pertinho e vizinho daqui do nosso Brasil.
Fiz parte do júri que deu prêmio pelo Sindicato dos Jornalistas ao colega Antônio Carlos Fon que escreveu bela reportagem sobre os bolivianos para uma revista de circulação ínfima. Defendi a premiação para fazer justiça a este grande repórter e, ao mesmo tempo, chamar a atenção para este povo espoliado, injustiçado, colocado às margens neste Brasil imenso e trágico.
Esse povo, pelo que tenho conversado vive mal por aqui, mas por lá é pior ainda. Uma moça com quem conversei recentemente em uma viagem de ônibus me disse que ganha um salário dez vezes maior do que quando morava na Bolívia. Quando ela desceu e caminhou meio que envergonhada em direção à favela, achei que estava exagerando. Outros bolivianos confirmaram a extrema pobreza em que viviam.
A maioria dos bolivianos vivem do difícil trabalho da costura. Pedalam máquinas industriais produzindo roupas que são vendidas na elegante e charmosa Oscar Freire como também em lugares bem distantes do comércio popular destes rincões Brasil afora. E vivem em uma miséria de dar dó. São explorados à exaustão, muitas vezes pelos próprios conhecidos e amigos de lá.
O Ministério do Trabalho volta e meia atende a reclamação de algum boliviano mais revoltado com a situação e dá uma dura. O pior ainda neste Estado em que vivemos é a falta absoluta de segurança. Muitos desses trabalhadores têm sido assassinados por nada. Simplesmente porque os ladrões acreditaram que eles tinham um montão de dinheiro no cofre e, ao abrir, acabam decepcionados porque ali não tinha nada.
Esse povo vive uma insegurança de arrepiar. É preciso fazer mais do que o Ministério do Trabalho sazonalmente faz. É preciso estar atento 24 horas para que não se dizimem uma parcela dos bolivianos que aqui vieram por falta de lugar melhor e mais promissor para que saíssem da miserabilidade em que estavam e continuam atolados. Só querem trabalho e dignidade.




Flagrante de uma boliviana em seu local de trabalho e moradia, onde ainda com coragem criam filhos