Encontrei o Poeta Gerardo Mello Mourão sozinho em leito do
Hospital Beneficência Portuguesa. Falamos pouco sobre jornalismo (ele foi
correspondente da “Folha” na China) e menos ainda sobre literatura (só por ter
escrito um romance como “Valete de Espadas” seu lugar na Academia Brasileira de
Letras estava assegurada). Deixei que ele falasse de um caso que o tinha
espantado, parecia que isso, de certa forma, encerrava com uma dura lição.
Gostaria que ele escrevesse a respeito, mas como não o fez, faço-o agora com
menos brilho e talento.
Velho patriarca mineiro, dono de banco que em comercial
dizia abrigar como guarda-chuva seus correntistas, certo dia chamou o filho a
quem havia passado a chave do comando. Disse que Zé Mineiro o procuraria em
poucos dias para pedir um empréstimo. Contou que não se assustasse com a
aparência humilde do amigo, mas que ficasse certo de que a fortuna que a família amealhou
na vida devia a pessoas como esse mineirinho, amigo nas horas certas e também
incertas.
Passado um tempo veio à ideia do patriarca lembrar o caso
encaminhado para o filho. Perguntou se ele tinha resolvido o problema. O filho
disse que tecnicamente não havia a menor condição para a concessão do
empréstimo. O pai cortou de pronto, afinal, argumentou, se fosse preciso passar
pelas comissões técnicas ele não precisava recorrer ao filho. Bastava chamar um
diretor da área técnica e expor o problema, ordenando que tudo se resolvesse.
Mas como o filho é quem estava no comando do banco ele lhe encaminhou o problema,
certo de que tudo seria resolvido da melhor forma possível.
Meses depois o banco entrou em situação falimentar, houve
tentativa de socorro das instituições financeiras governamentais, mas sem
sucesso. O velho patriarca atribuiu o fracasso da gestão do banco que um dia fundou
a mil questões, entre elas a que levou ao filho para resolver, e que a insensibilidade
atroz impediu de fazer algo - uma metáfora do fracasso e da insensibilidade
aliadas que costumam dar no que dão.
Na despedida ganhei do grande escritor
um presente original, tirado de uma pasta na cabeceira do leito, um belo poema.
Nenhum comentário:
Postar um comentário