domingo, 7 de dezembro de 2014

Chico Papagaio

Nos tempos idos da minha infância, passada mais da metade do tempo atrás do balcão onde mal alcançava, aparecia todos os dias, invariavelmente, o pernambucano Chico Papagaio. Começava a conversa com papai por volta das 8, 9h da manhã, dava uma pausa para o almoço, voltava e se estendia até ao final da tarde, por volta das 19h, antes mesmo de iniciar a telenovela que fazia a alegria de todos ali. Era estivador no cais de Santos, litoral paulista, e não saia de casa sem sua bicicleta.
Tinha uma penca de meninas, acreditava como seus antepassados que se chegasse à sétima filha a mais velha é quem teria de batizar, se tornar madrinha, sob pena de a última, a sétima da prole, se tornar bruxa. Ele acreditava piamente nisso. Só que ao invés da sétima filha veio um menino, ao qual ele batizou com seu nome, não sei se acrescentou o Filho ou Júnior. Não lembro mesmo. Só sei que as meninas quase não falavam. Só concordavam ou discordavam com um gesto da cabeça. A um simples olhar do pai as meninas diziam um lacônico "sim" ou discordavam respondendo um simples "não".
Chico Papagaio contava que em sua terra uma vez os amigos foram colher uma jaca tão grande que precisou de cinco a seis homens para tirar do pé. Levar para a feira foi outra epopeia. Os matutos faziam a farra. Era um desfilar de casos de sua terra, a amada Pernambuco das cirandas e dos bonecos gigantescos que desfilam todo carnaval.
Mas o que faz este mundo corporativo sempre explorando os mais necessitados e mesmo aqueles que nunca se aventuraram por seus corredores é de amargar. As duas meninas mais velhas do Chico Papagaio que não falavam, um dia se viram desafiadas a vender perfumes, desses que se oferecem de porta em porta. Elas procuraram as moças da minha família (mamãe e uma irmã, Regina, a caçula) e falaram com uma desenvoltura que causou surpresa para os vizinhos, que se juntaram e foram ver a exposição tão didática, feita de forma incomum por aquelas duas mocinhas, na flor da idade, desfilando um arrazoado de argumentos em favor dos produtos que ofereciam. Nada melhor do que uma venda, disseram aliviadas após vencerem a tal empreitada. Sucesso total. Milagre dos céus na terra do cangaço?

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